Turquia

Turquia

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

sobre a infância, o trabalho, o verão e a essência





sul do brasil. verão na ilha maravilha. férias, trânsito lento, caos. quarenta e duas praias. mística e mistura. sotaques de todo canto. procura. sentido. sentimento. na beira da praia tudo e nada. gente de todo tipo. falta espaço. sobra lixo. o vazio.

- moça, compra castanha?
- quanto é?
- um é quatro, três é dez.
- me vê um.
- leva três...
- não dá, só tenho quatro.
- seu marido tem dez.
- não tem.

...

- quantos anos será que tem este menino?
- seis ou sete.
- tanta malícia. cadê a infância desta criança?

...

o menino trabalha no sol. o  menino magrelo de sotaque nordestino. o olhar cheio de lacunas. perdido no horizonte. corpo franzino e molhado. entre uma venda e outra ele brinca e quase esquece a dor de não ter infância. não tem roupa de banho. de cueca mesmo ele entra no mar. e trata de acalmar o tempo quando encontra a menina rechonchuda que tem roupa de banho mas prefere ir à praia de calcinha. seis ou anos também.

- como é o teu nome?
- helena. e o teu?
- luiz fernando. olha aquela onda. vamos mergulhar.

- vamos. me dá a mão.

(Bianca Velloso)

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Solo


  Solo

  Cachorro morto estendido
  No chão da cozinha.
  Bicicleta roubada largada
  No chão da garagem.
  Mãe abandonada confundida
  Choro espalhado
  No chão da sala.

  Primeiro chão do filho.
  Solo seco de sombra.

  Roupa suja pisada
  No chão do banheiro. 

  Irmã entre soluços
  Cortados à faca
  No chão do quarto.
  Medo partido cravado

  No chão embaixo da cama.
  Raiva recolhida rasgada
  No chão da garganta.

  Desespero solto disperso
  No chão da guerra intestina.
 
  Filho da mãe desaparecido 
  Sem chão pela porta da frente.
  Para sempre.

 
Lígia Sacras  

domingo, 4 de janeiro de 2015

Pedra-Sabão
O  áspero talco seca sob pés descalços
Odores vermelhos atraem abutres,
Olhos famintos que pousam em árvores frondosas.
O externo  quebrado retalha o coração limado
Pulsação ante a primeira queda.
Limbo das nuvens cinzas  ameaça e salva
Desaba sobre pés delicados...
As sombras de folhas  amarelecidas evaporam

Pés rudes bailam ardente(mente) num pátio de pedra-sabão.
Escultura em pedra-sabão: Mulher (autoria desconhecida). Artesanato popular em Minas Gerais.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Novos mares




Olho a porta próxima
abri a saída continua opção
silêncio adquirido no grito
simplória vocação.


Até onde ouço a concha
perco meu labirinto tinto
tocha acesa não vê trevas
Minerva é tudo que sinto.

Ô Deus porque escapa
o fio transpassa muito sangue
tenho espelho e ele é ré
inglório exangue.

O barro alça voo
sem asas ou calmaria
pausas no compasso seco
entretanto cantam bela poesia.

Entender o plano poeta
é ser linguagem atemporal
beber a sede desse mar
e deixar o vento levar o sal.
- Iatamyra Rocha