Turquia

Turquia

domingo, 28 de dezembro de 2014

ah se não temesse essa atrocidades cometidas por loucos fanáticos e retrógados enquanto  por a quidamos risadas de programas xulos na tv comemos nossas ceias natalinas
povos culturas  ideologias são destroçados como formiguinhas
ahhh se eu não temesse a mim mesma
ahh se eu não temesse o mundo..santa maria rogai por nós

nós

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Sobre a religião e o riso

Tela da artista plástica Eli Heil


"Muitas doenças da alma decorrem do fato de que nos levamos a sério. Os demôios são sérios e graves. Deus é leve e ri. 'O riso é o início da oração' (R. Niebuhr)." - Rubem Alves

Houve um tempo em que eu não ria, tinha desaprendido, andava triste, cabisbaixa, não acreditava na beleza... Cheguei mesmo a pensar que o melhor era deixar de ser... Apesar de estar de mal com a vida, nunca deixei de amar as pessoas: a família e os amigos foram fundamentais neste processo de luta contra a depressão. Quando já estava levantando do torpor e reaprendendo o riso, ganhei, de uma amiga, um rosário trazido lá da terra de Madre Paulina. 

Não acredito nas religiões industrializadas e muito menos nas igrejas. Gosto de sonhar meu próprio Deus, inventar minha religião e meus rituais. Tenho minha maneira de conectar-me à energia divina: um banho de mar, uma caminhada... Fechar os olhos, sentir as batidas do coração, tirar os pés do chão, visualizar o universo, chegar até uma estrela, imaginar que a luz retorna a quem precisa... Existem alguns estudos sobre a etimologia da palavra religião, um deles diz que significa religação, algo como religar-se à própria essência, ao que é sagrado e divino.

Apesar de não acreditar nas instituições religiosas, não duvido da fé, ainda mais quando nos chega com gestos de amor... Respeito e admiro qualquer tipo de crença. A fé nos ajuda a persistir! Acredito que a energia do amor é capaz de transformar tudo! O poder curativo do rosário vem muito mais do amor que recebi da amiga do que objeto ou da bênção de alguém que nem sabe que existo!  Guardei o presente na caixinha do carinho.

Tempos depois, com a alma curada, sabendo rir novamente, tornei-me mãe: Helena chegou na minha vida, cheia de luz e alegria! Mais uma maneira de religação com o divino! Nunca ensinei religião à minha filha. A energia divina é presente e intensa nas crianças! As crianças não necessitam da gravidade da palavra! As crianças são a própria essência sagrada!

Quando Helena estava com dois anos, mais ou menos, abriu a caixinha do carinho e encontrou o rosário:

- Mãe, o que é isso?

- É um rosário, meu amor!

- E para que serve?

- Para rezar! - respondi sem me dar conta de que ela não sabia o significado da palavra "reza".

Colocou o rosário em volta da boca e deu uma gargalhada.

- Olha, mãe, eu "risei"!

Caí na gargalhada também! Com todo respeito às diferentes crenças religiosas, mas o Deus dos meus sonhos dá muito mais valor às risadas do que às rezas decoradas!

- Bianca Velloso -

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

RECANTO DE NATAL


 


Os habitantes da cidade de Velnomound, Norte de lugar nenhum, têm uma forma muito particular de comemorar o Natal. Todos os anos, no dia 1 de Dezembro, o Prefeito Feldeman Shortan reúne os representantes da pequena população de 8.000 habitantes para uma curiosa Assembleia seguida de uma importante votação. Dividida em quatro Vilas, com um representante para cada uma, a população local espera ansiosa o resultado do encontro anual.

Composta por um secretário, uma escrevente, um Presidente e um jornalista encarregado de participar o resultado do encontro ao resto dos moradores, a reunião começa com a chamada nominal de cada representante de Vila. Este ano estiveram presentes: Salma Vicontes, da Vila Sobby, Edgar Mistiganny, da Vila Dinthon, Mark Victório, da Vila Bell Canto e Endora Neuman, da Vila Evelyn Weve.

Depois de devidamente sentados, cada representante apresenta a indicação de um nome, recolhido entre a população de sua respectiva Vila e explana sobre os motivos da escolha de tal candidato. Então, dá-se a votação mais curiosa de que já tive notícia, em comemoração ao nascimento do senhor Jesus Cristo os participantes elegem o habitante que mais tenha sido afectado pelos reveses do destino durante o ano e passam e arcar com todas as despesas de sua Festa Natalícia. O benefício entende-se à família e pode ser prolongado até ao meio do ano vindouro, se por acaso o eleito se encontrar acamado ou impossibilitado de trabalhar. Como o molde escolhido para a comemoração de Natal já está em seu quinquagésimo quarto ano, não existem muitos habitantes em condições inferiores, o que demonstra o sucesso da ideia que vai para além das comemorações de fim-de-ano e contamina a todos com a necessidade de estender a generosidade ao próximo, por conta própria e sem necessitar de eleições.

É muito comum que os vizinhos se ajudem e compartilhem os seus bens uns com os outros, criando assim um moto contínuo de vigília pelo bem-estar alheio que já faz parte da cultura do lugar. Embora a cidade não seja muito rica e viva quase que exclusivamente da produção de leite e seus derivados, os habitantes se sentem afortunados em receber ajuda e ajudar, ficando muito felizes com suas vidas.

No meio da Praça Central existe o “Monumento ao Habitante Escolhido”, uma estátua feita em bronze, com um metro e meio de diâmetro e um metro setenta de altura, que retrata oito pares de mãos entrelaçadas formando uma roda. A obra foi doada por um famoso escultor que no Natal de 1976 sofreu um grave acidente na estrada que passa na entrada da cidade e foi imediatamente eleito o “beneficiário extra” daquele período, junto com o Senhor Froudin Portemen, que havia sido escolhido por ter perdido um filho em meados do ano e nunca mais ter-se sentido feliz. O artista ficou tão grato e encantado que doou à cidade a obra e todos os anos ainda passa o Natal com a família a fazer o mesmo que aprendeu no inesquecível lugar.

Este ano o “Habitante Escolhido” foi a pequena Magi Carp, da Vila Dinthon, uma menina de 11 anos que acabou de descobrir-se com leucemia e precisa de todo o apoio e muitas belas bonecas para alegrar a sua vida.

Os preparativos da festa começam no dia 10 de Dezembro e vão culminar na ceia comunitária no dia 24 de Dezembro, na praça central, com o Habitante Escolhido, recebido como um Rei, sendo o centro das atenções e das homenagens. Já soube que as mulheres da cidade prepararam 14 lindas bonecas, um vestido de baile e já fizeram a lista de presença para se revezarem nos mimos e cuidados no dia-a-dia da menina durante o resto do ano.

Duas coisas porém são indispensáveis que eu diga:
Curiosamente a população de Velnomound não é católica;
Infelizmente, Velnomound não existe.

Os vãos




Sou uma pessoa boa
varro o chão
e deixo o cloro agir
na porcelana branca
o importante não é ser herói
fazer um bom negócio
tirar da terra o sustento de dez bocas
tirar de dez bocas o sustento de uma terra
o importante é deixar a porcelana branca
sem mácula
núbil
para que possam ver que está limpa
e tenham prazer em cuspir ali,
em vomitar naquele branco absoluto,
em defecar como quem sonha cataclismos
a paz entre os homens
a imortalidade da alma
a aniquilação do Aedes egípcio

Sou uma pessoa boa

e levo tudo isso em consideração
quando tiro as luvas 
e deixo o cloro agir
na porcelana branca
desde criança tinha essa sensação
uma fatalidade genética
um dom por escrito
ser uma pessoa boa
o Criador atochou toda a bondade do mundo
no meu fardo e tocou o cavalo comigo para longe
eu não preciso ser feliz
não preciso de muito dinheiro
a pessoa boa ama tudo que a cerca
os passarinhos
os gestos pequenos 
o abrir uma caixa de fósforos
o relojoeiro das avenidas
o trem na plataforma
o intervalo da timidez
os injustiçados

Hoje seria mais um dia para ser uma pessoa boa

entanto acordei de um sonho ruim 
numa cidade absurda
onde faço toda espécie de maldades 
sem grafia
sem regras
sem lei
e sinto-me mal
uma angústia me escorre dos poros
como ouro falso
eu não devo ter limpado direito
a frincha das portas
uma pessoa boa precisa lembrar
de todos os vãos
para que o sono não lhe faça mal
uma pessoa boa não usa luvas
toca a porcelana branca só com a ponta dos dedos.